É fato que, de todas as tradições de bruxaria possíveis no paganismo, a Wicca é hoje a mais difundida, mas vale lembrar que embora todo wiccano seja bruxo, nem todo bruxo é wiccano. Eu, por exemplo, embora tenha muitos amigos em diversas tradições da Wicca e participe de muitos eventos e festivais organizados por templos e igrejas de Wicca, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, não sou praticante dessa linha, mas sim do que se chama Bruxaria Tradicional ou Old Craft.
Porém, acho necessário esclarecer que minhas práticas e minha linhagem também não são as mesmas dos conceitos e preceitos sobre os quais foi fundado no Brasil o Conselho de Bruxaria Tradicional. Pelo que entendi através do material da organização e também de conversas com o pessoal do Conselho (e posso estar equivocada), eles consideram Bruxaria Tradicional as linhagens de ensinamentos e práticas que descendem diretamente de práticas familiares ou locais da Europa pré-cristã e que sejam puras e fiéis à região de onde a tradição provém. Por exemplo, se minha tradição é Britânica, eu não poderia misturar panteões de deuses, mesmo morando nas Américas, mas sim preservar e conectar-me com os deuses de um único panteão, Celta, digamos; bem como eu não poderia misturar práticas de magia cerimonial ou de outras linhas mais modernas ou não.
Há quem defenda por aí que Bruxaria Tradicional mesmo não existe, por não existir mais nenhuma tradição tão pura que não tenha sofrido influências ao longo dos séculos, e também há quem diga que Bruxaria Hereditária (que é uma vertente considerada tradicional) é algo inventado e muito discutível. Discordo desses dois pontos por conhecer e descender (no sentido de ter por mestres e ter recebido linhagem) de bruxos incríveis que são exatamente dessas vertentes. A força e a verdade de um mago ou bruxo a gente conhece pelo trabalho e pela vida da pessoa, acho dispensável ficar debatendo se os meios pelos quais a pessoa faz seus contatos nos outros mundos – e desenvolve seu trabalho neste – são ou não validados pela pequenez de nossa classificação e hierarquias humanas. Isso é necessário quando a pessoa quer fazer ou se diz parte de uma tradição instituída com regras próprias; fora isso, tudo é possível, e temos de estar abertos a todas as formas pelas quais os poderes podem se manifestar e os conhecimentos podem ser transmitidos aos andarilhos desses muitos caminhos.
A Bruxaria Tradicional na qual percorro meus dias e trabalhos mágicos é em parte pré-Wicca e dela difere em várias coisas, porém tem sim misturas bem contemporâneas, o que é impossível de evitar já que estamos tão globalizados (não só em nossas informações, mas em nossos próprios genes!!!), e por isso estou curtindo muito a nova alcunha que vi para o termo: Bruxaria Tradicional Moderna.
Meu amigo, e agora também professor, Gede Parma, que é um autor pagão australiano, anda fazendo umas postagens no facebook compartilhando certos conceitos sob sua ótica de bruxo tradicional.
Achei a definição de Bruxaria Tradicional maravilhosa e pedi permissão para traduzir e postar – a qual ele concedeu. Segue, portanto, a definição de Tradicional Witchcraft ou Old Craft segundo Gede Parma:
“1. Um movimento diverso do renascimento da Wicca nos anos 1950 e 60, centralizado inicialmente em torno de Robert Cochrane (Roy Bowers), o mestre original (conhecido) do Clã de Tubal Cain. Alegações de linhagem/costumes de bruxaria mais autêntica ou pré-moderna eram centrais a esses debates e perspectivas. Por fim, embora o movimento moderno conhecido amplamente como Tradicional ou Old Craft seja contemporâneo da Wicca, não deveria, na minha opinião, ser definido constantemente contrapondo-se a ela.
(Com uma ressalva: um Wicanno Gardneriano pode de fato ser um bruxo tradicional, assim como um bruxo tradicional pode também ser iniciado na Wicca. Enquanto o ritual da Wicca aparenta ser fundamentalmente baseado em magia grimórica salomônica e renascentista, o ritual da maioria das linhas de Bruxaria Tradicional bebem do folclore europeu codificado em histórias/canções/rimas antigos, costumes localizados e também do testemunho de várias bruxas acusadas durante a Inquisição).
2. Qualquer prática de bruxaria ou linhagem/tradição/clã inspirados na bruxaria histórica e folclórica da Europa e sua diáspora, identificando-se com ela de formas texturizadas e narrativas.
3. Assim como no item 2, e potencialmente se identificando com o item 1, uma bruxa tradicional trabalha tanto com linhas vermelhas quanto brancas. A linha vermelha se refere ao conhecimento e práticas bem avermelhados, passados de mão em mão, de boca a ouvido, do sopro à carne, através do tempo e do espaço. A linha branca é a gnose iniciática/iniciatória e a comunhão reveladora aprofundada ou visionária com o Outro Mundo, com os espíritos, com os espíritos pessoais, por exemplo, Inspiração. Bruxaria sem conexão e sinergia conscientes (como pactos, casamentos e promessas) com os Espíritos, definitivamente, não é bruxaria tradicional.
Passada a mim pelo Fogo Divino
pelo Olho, de novo e de novo
Branco o clarão do Lorde Serafim
Fiado dentro da Próprio Corpo da Mente
Vermelho o Rio inchado e forte
na terra da Soberania
onde rainhas antigas deram luz
às histórias que me libertariam
Vivificado em prata na Noite
onde o silêncio traz o sonho carregado
entre o Pensamento e a Memória
Ó antigo conceda a Chama Real
Três Fios trançados em meu Cordão
Serpente Viva no meu pescoço
pendurada como o laço do Enforcado
Astúcia dos bruxos, feito dos bruxos.”
Gede Parma ainda adiciona abaixo do post mais alguns comentários:
“Exemplos de Tradições contemporâneas que são consideradas ou se dizem ‘Tradicionais ou Old Craft’ incluem:
Clã de Tubal Cain
Cultus Sabbati
1734
Anderson Faery/Feri (também chamado Vicia)
Anderean Craft
Sophian Thread of WildWood
Glenshire Order of Witches
Lady Circe’s Lineage and Mantle-Bearers
Além da miríade de outros grupos e indivíduos conhecidos e desconhecidos que usam ou não algum nome.
Também devo mencionar que outra explicação muito direta de Tradicional ou Old Craft é qualquer grupo, prática individual, ordem ou linhagem que seja anterior ao revival dos anos 1950 e dá seguimento a costumes, técnicas e conhecimentos mais antigos.
E AINDA, que estou ciente de que dentro das tradições Gardnerianas e Alexandrinas há amplos conhecimentos tradicionais, práticas e técnicas!”
Então aí está. Espero que esses comentários ajudem a esclarecer mais uma das vertentes possíveis para vivermos essa espiritualidade tão fascinante.
Republicou isso em Bosque Ancestrale comentado:
Texto que muito tem a acrescentar às atuais discussões sobre Wicca e Bruxaria Tradicional.
Estou aprendendo só
Alguém pode me orientar
Gosto da bruxaria tradicional
Meu e-mail fernandinhamaxlove@hotmail.com
oi Maiara
em setembro vou começar um novo ciclo de formação mágica. Demora a engrenar na bruxaria em si, pois todo o trabalho dos primeiros meses é em aprimorar seus sentidos etéricos e abrir sua percepção, então tem muito trabalho mesmo, e pouco glamour. No final sim, a gente entra na parte da ritualística e processos da bruxaria tradicional. Se vc estiver interessada, fica atenta aqui no blog que vou abrir as inscrições ainda agora em junho. Aí você dá uma olhada e vê se é pra você.
Mt bom ter tido acesso a material bastante enriquecedor sobre assunto sobre o qual me interesso.bastante e pretendo me aprofundar de forma continua e gradual